Relatos de Prática Vencedor 2014 - Profª Rose-Meire Dias Santos
Rose-Meire Dias Santos - Escola Estadual Jardim Araguaia - Barra do Garças / MT - 2014
Caro leitor, uma boa leitura / refeição depende de um bom texto / alimento, que depende de uma boa temática, que depende de nutrientes sadios e de um cardápio propício e convidativo.
Embasada na obra da socióloga Rosa Belluzo, "Machado de Assis – Relíquias culinárias", a jornalista gastronômica Guta Chaves afirma que "como Machado de Assis, é bom imaginarmos que a vida é um banquete e que chegaremos à sobremesa".
Entrada: Como um vício, a Olimpíada de Língua Portuguesa entrou em minha vida em 2008. O tempo foi passando e como o vinho, mas de "caju" do distrito da Voadeira (Festival do Caju), melhorei e incorporei um "pot-pourri" mato-grossense.
O prêmio de melhor Relato de Prática do Centro-Oeste, na categoria Memórias Literárias, em 2010, foi o incentivo e a base desse estilo metafórico / imagético. Em 2012, descobri que conseguia "cozinhar com as palavras" e servi aos meus educandos essa "minha maneira", como uma bela herança!
Rubem Alves diz que "palavras e comida vêm da mesma substância. Elas nascem da mesma mãe, a fome... e a tarefa do professor é a mesma da cozinheira: antes de dar faca e queijo ao aluno, provocar a fome...".
Prato principal: Minha culinária / prática baseia-se na sequência didática do caderno de receita poética do "Gran Chef" gastronômico Olimpíada de Língua Portuguesa, que teve como Mestre-Cuca Bakhtin! Etapas de preparo distintas, ingredientes e condimentos tipicamente regionais e exóticos, para que a refeição seja degustada como iguaria exclusiva de sensações: o ver, o exalar, o ouvir, o tocar e o saborear, no maior banquete "self-service" literário do Brasil!
Na semana pedagógica de 2014 reli o material da Olimpíada; separei materiais produzidos por pessoas da região: livros, documentários e outros; tracei a metodologia; pesquisei que "diferencial" utilizaria nessa edição, poemas de apoio como "Café com pão" de Manoel Bandeira e "Cantos da noite: dueto" produzido por mim em alusão ao povo Xavante; inseri o material do "Gran Chef" no planejamento anual, entre o 1º e 2º bimestre para o preparo do grande "menu"!
Na cozinha caipira (escola), no fogão de lenha (sala de aula) em recipientes distintos (turmas), distribuí os ingredientes (materiais impressos e virtuais, cds, jogos etc) diversificando e adicionando porções de verbos picantes que elevam a serotonina, hormônio ligado a sensação de prazer, e dei início ao cozimento de alimentos regionais que o prato poema serviria: universo infantil, singularidades locais e metáforas imagéticas.
Incendiei os educandos na primeira semana de aula, pois o sucesso desse trabalho dependia dessa energia! O meu tempero energético ecoava por toda cozinha: "Está vindo, Rose: tsunami, furacão!". Criei um lema com eles: "O importante não é ganhar, mas dar muito trabalho a todos os participantes de cada etapa”. Minha energia contaminou a todos e os olhos brilhavam!
Percebi que a fumaça do fogão e o cheiro da comida incomodou colegas que diziam que eu estava ficando louca! Ignorei, pois falar e repassar gênero literário, no ensino fundamental, o educador tem que senti-lo, para que o processo seja verdadeiro. Eu tinha que alcançar a essência de cada aluno e esse era meu diferencial! Nesta fase de inquietudes lembrava de Santos Dumont e de Valdon Varjão que não desistiram dos seus sonhos, pois só levam pedradas árvores que dão frutos saborosos.
Desenvolvi as oficinas; cada avanço e passo dado eles se entusiasmavam e mergulhavam no meu universo literário! Derramava dramaturgia, imitavam-me e cada aula era um "flash"! Mostrei que eram capazes de escrever também com emoção! Usei o processo da câmera lenta, isto é, quando fossem falar de algo que gostassem muito, congelassem aquele momento e fossem muito minuciosos dando ao leitor o maior número de informações possíveis.
Empolguei a galera! Cada texto que criavam, faziam questão de mostrar a todos os profissionais da escola e, nesse momento, meus colegas começaram a elogiar meu trabalho, pois perceberam que ali havia muita dedicação!
Extraí do grupo criticidade - a cada texto lido em sala, suspiravam, elogiavam e davam sugestões para que o colega enriquecesse seu poema.
Emocionei-me com cada texto produzido! Observavam atentamente a minha expressão facial, pois sabiam que quando eu gostava, lágrimas escorriam dos meus olhos e arrepiava, pois uma magia incrível invadia meu ser!
Pedi que elaborassem textos com um grau de dificuldade maior: metafóricos/imagéticos, isto é, com uma imagem paralela e eles surpreenderam! Ficavam esperando as leituras dos colegas só para conhecerem a imagem de cada um: Baú encantado, Minha casa enigmática, Duas faces, Toc daqui e toc de lá, Residencial Barra do Garças, Na passarela belezas mil, Na batida do Wallyc, Show da poderosa, Sopa de letrinhas... Revisei os textos durante as aulas com cada um deles, num trabalho de abelhinha, saboreando cada imagem paralela!
Uma jovem surpreendeu-me com a sua fala: “Professora, hoje eu disse a minha mãe que eu não quero ser mais arquiteta e sim poetisa!” - Meus olhos lagrimejaram e eu disse a ela que poderia conciliar as duas coisas. A cada aula me trazia um poema novo, fora o que estava empenhada: Olhar de menina, clic! Ela queria que eu os lesse para a turma e eu dizia: “Só irei ler seus poemas se você se sair bem na verificação de aprendizagem envolvendo todas as oficinas trabalhadas!” - Ela topou o desafio. No dia da verificação, ansiosa me disse: “A senhora vai ler os meus poemas?” - E eu respondi: “Aqueles poemas mixuruquinhas?”.
Distribuí as verificações e quando ela virou a folha era o seu poema! Ela foi aos prantos de tanta emoção e de repente vi vários alunos chorando, pois acharam lindo o que ela havia escrito e eu também! A coordenadora veio até a sala de aula para ver o que estava acontecendo e se emocionou também! Foi a cena mais linda de toda a minha vida como educadora!
Finalizei com uma autoavaliação e pedi que relatassem os aprendizados, descobertas, pontos positivos e negativos identificados durante o trabalho. Arrumei a mesa literária, com a toalha fina da minha prática nela desenhada: empenho, estratégia, dedicação, montagem e, sobre ela, os pratos à brasileira, e no bufê, poemas à moda barragarcense!
Que som, que aroma e "tin-tin" ao "Gran Chef" Olimpíada de Língua Portuguesa Escrevendo o Futuro.
Ah, que sabor, que banquete!
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